segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A crônica da dor.



-Como é a dor? Perguntam-me os que não fazem a mínima ideia do que é o tal do Lúpus.

Aí, fico pensando, como explicar o que nem eu mesma às vezes sei?

-Dói tudo, uma dor estranha, geral. Entendeu?

Não, ninguém entende, porque é tão íntimo, tão meu. Nem mesmo um lúpico entende o outro já que a doença pode vir de tantas formas.

Aí, me pego pensando nesse universo particular, cheio de altos e baixos.

Há dias que nem me importo que ela exista. Nem a dor nem a doença.

Em outros, desejo intimamente fechar os olhos e não abrir mais. Nessas horas sou tomada, além da dor, pela culpa cultural, pela minha cobrança interior de que como posso eu pensar em desistir?

Mas aí é que está, nunca desisto. Há dias que nego, aceito, interrogo, desespero e me acalmo, tudo em questão de horas ou minutos e continuo. Não por eles, mas por mim.

Há tanto ainda que não vi, tantos livros que não li, tantas risadas que não dei.

Preciso de mais tempo e às vezes de morfina, mas quem nunca precisou?

E da dor nasce a crônica. Confusa, espessa, pesada, esperançosa, de que alguém a leia e busque a cura de algo que já se tornou crônico.



Luciana Barbosa.

domingo, 29 de novembro de 2009

Este ano.




Este ano, pela primeira vez, notei uma ruga em meu rosto e tive a sensação de que o tempo é implacável e que nunca estaremos preparados pra isso.

Este ano, aprendi que o amor não deve ser nunca sublimado, porque mesmo cercado de cuidados, ele vive de constantes adaptações e nem sempre é fácil.

Também este ano entendi que amigos verdadeiros são sim, contados, infelizmente, nos dedos e que possuímos ao longo da vida mais conhecidos que preenchem nosso currículo social do que amigos que são a nossa base forte para seguir e que os poucos e bons amigos que temos fazem toda a diferença na nossa caminhada.

Este ano aprendi que menos é sempre mais.

Que não quero morrer de trabalhar e que tenho o hoje para viver, amanhã sempre será algo que pode nunca chegar.

Este ano assisti a muitos filmes, li poucos livros, experimentei sabores diferentes e por várias vezes, mesmo rodeada de gente, me senti sozinha e sem lugar.

Ah, este ano! Tive crises de riso impagáveis, crises de choro incontroláveis e mantive a esperança de que tudo tende a ser melhor por mais que não seja.

Também consegui enxergar, que não sou eterna, insubstituível e necessária o quanto gostaria de ser para os que mais amo e que isso não é o fim, e sim, a sequência natural da vida por mais que doa e dói.

E mais uma coisa, aprendi que o mundo não para enquanto sofro e que nossas dores não devem ser eternas, e isso depende exclusivamente de mim.

E olhando pra trás percebo que todos os anos são complementos e que sempre esperamos o próximo para recomeçar na esperança de sermos um pouco mais felizes.



Luciana Barbosa.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

“Ser” mãe.



Sim, sou mãe, antes não o tivesse sido.
Porque mãe não vem com manual, não tem curso de graduação em nenhuma faculdade e muito menos ensino a distância.
Ninguém nos prepara para os choros infindáveis, a doação extrema e o amor sufocante.
Por um tempo deixamos de existir para sermos o “ser” mãe.
E aí, dá lhe sonhos, projetos, perspectivas, projeções e afins.
Achamos que basta ensinar. Do nosso jeito e do jeito que enxergamos o mundo.
Tolas que somos.
Indivíduos que são.
Crescem, e com eles a infinidade do mundo. Gostamos de parecer modernas e enchemos o peito para dizer que são do mundo.
No fundo gostaríamos que o mundo deles fosse sempre nós, e que a primeira série nunca acabasse, que um beijo nosso curasse todas as feridas, que nosso abraço fosse o melhor lugar do mundo.
Sim, eles crescem e nós, mães que somos, ficamos paradas no tempo, diante de uma fotografia antiga esperando que tenham sempre o melhor e que sejam sempre melhores.
Ah! e lógico! Que nos amem incondicionalmente.

Luciana Barbosa.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Silêncio!




Imóvel, tento ouvir o meu silêncio interior.
Um minuto.
Dois minutos.
Três minutos.
Uma eternidade.....
Ele, o silêncio fica lá.
Sombrio.
Parado.
Calado.
E no final das contas descubro o óbvio.
Não há nada a ser dito.

Luciana Barbosa.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Detalhes.



Amo viver e amo, acredite, por causa dos detalhes.
Deixe-me explicar. Tento sempre andar de cabeça erguida pra não perder o espetáculo que me cerca todos os dias, e olha que são muitos.
Um exemplo é a infinidade de cores, de flores, de rostos e formas que nos deparamos todos os dias. Agora mesmo, vi um senhor de uns oitenta anos, beijando a mão de sua amada com o olhar mais apaixonado do mundo e pude assistir a cumplicidade de tantos anos em apenas um momento, com apenas um gesto.
Amo quando vejo o detalhe da gentileza, da boa educação, do amor dedicado, da amizade sincera.
Detalhes queridos, assim como o cheiro da casa limpa, da roupa lavada, do filho amado, do amor feito e aquele maravilhoso cheiro de mar. Sim, porque apesar da grandeza do mar, de sua riqueza, guardamos na lembrança os detalhes como, cheiro, cores e o barulho das ondas indo e vindo.
Você deve estar se perguntando onde quero chegar com toda essa história. Simples!
Há dias que gostaria de acordar em outro lugar, com outro nome, outro emprego. Só não mudaria o companheiro que tenho, porque este, tenho certeza, carrego de outras vidas.
Acredito que todos, em algum momento, também tem essa vontade de mudar tudo e que há vida por vezes se torna por deveras enfadonha.
Então, quando o coração apertar e você quiser mudar tudo de uma hora pra outra, levante a cabeça, olhe ao redor e perceba os detalhes que fazem da sua vida, única.

Luciana Barbosa.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Das flores as jabuticabas.



Moro em um apartamento e do lado dele, pela minha área de serviço, tenho a visão de um imenso terreno baldio e encostado nele, uma casa que consegue ficar alheia a qualquer regra de segurança que a sociedade e a violência nos impõem. Por incrível que pareça, árvore sobrevive lá, altiva, sem muros.

E em seu quintal, vejo um pomar sempre em produção. Goiabeiras, caquizeiros, uma mangueira, uma infinidade de ervas para chá e a delicada jabuticabeira.

Nunca havia me chamado atenção o tal pé de Jabuticaba, até chegar a primeira chuva do final de Agosto. Foi chover por uns dois dias e o danado se pintou todo de branco com suas flores em festa.

Aquela visão dos futuros frutos me tocou de uma maneira profunda e delicada.

Alheia às minhas dores, minhas alegrias, minha correria sem fim para lugar nenhum, a jabuticabeira se encheu de flores e beleza, e me fez recordar de uma forma profunda minha infância sem muros e sem tantos fantasmas para combater.

E enquanto meus olhos não se acostumam, aproveito o espetáculo e espero das flores as jabuticabas.



Luciana Barbosa.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Impaciência.



Há dias que ando daquele jeito!
Vontade de sumir...
Vontade de mudar...
Vontade de morrer...
Vontade de voltar.
Nada demais, nada de menos.
Ser humano, impaciente com a mesmice.

Luciana Barbosa.

domingo, 9 de agosto de 2009

Merece ser compartilhado!

Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto o seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar,tremendo, gaguejando, pediu ao pai:
-Me ajuda a Olhar!

Eduardo Galeano.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Cidadão do mundo.



Simão desde criança, sempre fora calado. Gostava de ficar por horas a fio, sentado num galho de uma goiabeira no fundo do quintal. Quando a mãe lhe perguntava o que fazia tanto por lá, mudo e sozinho por tanto tempo, ele respondia com o olhar distante que ficava apenas ouvindo o silêncio. Ela meneava a cabeça, achando seu filho um completo estranho.
Quando cresceu Simão continuou assim, tendo um mundo particular de poucas palavras, poucos amigos e sem nenhuma aventura aparente. Ele era para todos que o cercavam uma incógnita.
O que mais chamava atenção, era que, mesmo depois de formado em computação, ganhando seu dinheiro e tendo liberdade para fazer o que bem entendesse, continuava morando com sua família e passando preciosas horas no mesmo fundo de quintal e no mesmo galho daquela goiabeira tão envelhecida pelo tempo.
Outra mania de Simão era escrever e não pensem que ele usava o seu computador super moderno. Usava uma máquina de escrever, uma Olivetti que seu pai tinha deixado num canto da biblioteca mais como um enfeite, um objeto obsoleto e sem nenhuma utilidade.
O mais impressionante era que ninguém sabia o que possuía aquelas páginas. Ele nunca permitiu nem que sua mãe pudesse ler ou saber o que os escritos diziam.
Outra particularidade interessante de Simão era ele nunca ter saído de sua cidade natal. Desde criança, quando falavam que iam viajar, ele abria o berreiro. Gritava tanto que faltava enlouquecer seus pais. A avó sempre remediava dizendo que deixasse o neto para que lhe fizesse companhia.
Ele no auge de seus trinta e dois anos nunca havia ido á lugar algum, seu mundo e lugar preferido era aquele fundo de quintal.
Até que um dia, sem uma explicação aparente Simão não acordou mais. Foi embora dessa vida sem alarde e da maneira que ele mais sabia, calado.
A mãe, depois de ouvir as explicações médicas, de enterrar o filho, se trancou no quarto de Simão. Sentada numa cadeira foi passando os olhos devagar pelo ambiente tentando aliviar a dor que sentia. Até que parou os olhos numa caixa em cima do guarda roupa.
Com a ajuda do marido a retirou de lá e quando abriu, ela estava cheia de escritos de Simão. Camalhaços e camalhaços de folhas escritas na velha Olivetti.
A mãe abraçou as folhas carinhosamente e durante dias se dedicou a lê-las.
Ali, naquelas páginas Simão descrevia com uma clareza incrível, lugares que nunca esteve, romances que nunca viveu, comidas que nunca provou. Foi aí que sua mãe entendeu tudo.
Ele nunca quis sair de sua cidade, pois não precisava, ele já possuía o mundo todo dentro dele.


Luciana Barbosa.

terça-feira, 30 de junho de 2009

João Pedro e a calcinha comestível.



Impressionante como a tecnologia, a rapidez nas informações afetam até nossa vida sexual. Que nos afirme, João Pedro na sua procura pelas inovações e saciedade sexual feminina.
Há algum tempo ele já tinha chegado à conclusão que o homem já não era mais o macho dominante e que não bastavam apenas uns beijos mais quentes nas preliminares para garantir o tão complicado orgasmo feminino.
E o que era pior, as mulheres, na atual modernidade, e defendendo os direitos adquiridos à custa de muitos sutiãs queimados, agora sabiam o que exatamente queriam na hora do sexo. E dá-lhe pedidos: Mais em cima, mais em baixo, devagar, depressa, com mais pegada, de cabeça pra baixo e por aí ia.
Nessa busca pela satisfação feminina e sobrevivência digna da espécie masculina ele resolveu inovar e acabou num dia de desespero total num sex shop.
Aí entre brinquedinhos inovadores, gelzinhos que esquentavam e esfriavam, se deparou com uma calcinha comestível. Na hora veio a imagem de uma loira super gostosa que ele estava começando a sair e que queria mais que tudo impressiona-la.
Comprou a dita cuja sabor morango e mandou entregar com uma champanhe para sua presa, com um bilhetinho singelo que dizia: Te encontro mais tarde, vista somente isto.
Quando chegou a noite, se perfumou e saiu todo animado para o encontro, ao se deparar com a loirona belzebu, saiu faísca. Ela toda animada com o presentinho, só vestia a danada da calcinha, ele já caiu matando.
No meio do rala-e-rola, ele começou uma gemeção sem fim, a loira que ainda não tinha chegado lá, deu um ultimato, mas ele continuou ainda mais alto.
Ela olhou pra ele direito e viu que ele estava todo empolado, vermelho, com manchas horríveis pelo corpo, não conseguia nem falar direito.
Correu então com ele para o hospital mais próximo. Chegando lá, pergunta vai, pergunta vem, ela naquela aflição, ele ficando roxo, o médico olha bem pra ele e diz:
_ Isso é algo que ele comeu, intoxicação alimentar. Você sabe o que ele comeu hoje de diferente?
A loira ficou muda, como ia dizer para o médico? Ele só piorando, morrendo de medo de passar dessa para melhor, começou a se debater e desesperar e ela nada de falar. João Pedro tirou forças sabe-se lá de onde, agarrou o braço do médico e gritou.
_ Foi a calcinha!
Ele de primeira não entendeu, olhou para a Loira e aí sacou tudo. A intoxicação veio de uma calcinha comestível.
Deu uma risada disfarçada pensando que aquilo só acontecia no seu plantão, mandou João Pedro para fazer uma lavagem estomacal e passou os medicamentos necessários.
Depois de dois dias, ele recebeu alta e tomou uma decisão, iria continuar colaborando com todos os orgasmos femininos que pudesse, mas nada que pusesse a sua vida em risco, ah, isso não!

Luciana Barbosa

quarta-feira, 24 de junho de 2009

A dor Liberta!




Ele parecia sempre mal humorado, ranzinza, mas para quem o conhecia de verdade sabia. O que ele tinha era um amor daqueles mal curados e que se tornava ainda pior por ser parcialmente inventado.
Às vezes queremos adiantar o curso da vida e pegamos a primeira pessoa que passa e a maquiamos da melhor forma possível para aliviar a solidão.
Queremos fazer dar certo e inventamos alguém que só nós a enxergamos com tamanha perfeição e é onde nos machucamos.
Em determinado tempo de sua vida ele tinha inventado alguém e ao longo de anos sofria daquele amor mal curado.
E não adiantava os amigos falarem, nem as sucessivas brigas, ofensas e humilhações. Ele a havia colocado no altar imaculado dos sentimentos tolos e nada abalava sua esperança de construir uma vida a dois. Até que um dia adoeceu.
Não, não pense que foi de amor. Foi um câncer mesmo, daqueles que chegam sem avisar e nos pegam de surpresa num exame de rotina.
Com o laudo em mãos, sua vida passou a tomar um gosto diferente, e uma visão inesperada e mais consciente foi tomando forma.
E bastou uma conversa com o objeto do seu desejo para ele entender que a vida é importante demais para ser desperdiçada com invenções vazias.
Pela primeira vez teve coragem de verdade. Jogou fora as fotos, bloqueou endereços eletrônicos, cortou o mal pela raiz. Marcou a cirurgia e reviveu.
Porque há casos em que o amor em nada ajuda, mas a dor sim, essa liberta!

Luciana Barbosa.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Extremos!



Quando você vai embora, a primeira noite é sempre a pior.
A cama é muito mais cama...
Os pés são muito mais frios...
O silêncio é bem mais calado...
A saudade é muito mais dor...
Quando você retorna, ai bem sei.
Que a noite vira dia...
A cama fica pequena...
O silêncio sussurra...
O corpo esquenta...
E saudade, vira sinônimo de amor.

Luciana Barbosa.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Sem anestesia, por favor!



Não que eu prefira a dor, longe disso. Só de ver programas médicos, minhas pernas doem sei lá por quê. Me dá uma agonia como se tivessem cortando a mim, e não aquele fulano lá na tela.
Eu quero mesmo é a vida sem anestesia. Poder viver as emoções sejam elas quais forem. Como eu saberia diferenciar a fúria se eu não conhecesse a calma? O amor, se eu não provasse do abandono?
Sem as experimentações diárias, minha vida seria uma grande rotina e meu caminho um grande vazio. O bom, caríssimos, é ter história pra contar e chegar à conclusão que tudo é passageiro, então aproveitemos melhor os momentos e, mesmo nos dias que estivermos com vontade de amarrar o bode atrás da horta, que façamos! Afinal, nada melhor do que ser humano, mas lembremos também de tirá-lo de lá porque gente que reclama o dia todo é um pé no saco até pra quem não o tem.
Pense em coisas melhores pra fazer do que apenas passar pela vida, experimente pelo menos uma vez algo novo, nem que seja uma comida diferente e, quem sabe mais pra frente, até uma posição sexual mais ousada. Você merece!
E quando você achar que tudo está chato demais, parado demais, encare a vida e grite pra ela em alto e bom som:
_Sem anestesia, por favor!
Você vai ver que enfrentar os problemas ainda é o melhor remédio.


Luciana Barbosa.




segunda-feira, 1 de junho de 2009

segunda-feira, 25 de maio de 2009

A história de Jurema e Zé Pipoco.




Jurema era toda espevitada. Sorriso frouxo, ria de tudo e de nada. Trabalhava na casa de dona Sophia como empregada doméstica, mas dizia no morro que era secretária pessoal, aliás, enchia o peito pra dizer isso.
Dona Sophia era uma dondoca boa gente que vivia rindo da mania que Jurema tinha de querer ser famosa. Ela vivia dizendo que um dia ainda mandaria um vídeo para aquele Big brother, mas entrava ano, saía ano e ela nunca cumpria o prometido.
Amava ver sua patroa nas colunas sociais e se imaginava no lugar prometendo a si mesma uma primeira capa de jornal.
Seu salário, que nem era muito, era dividido sempre em carnês das Casas Bahia e revistas de fofocas. Amava os mínimos detalhes da vida de cada celebridade e não perdia um capítulo de novela, aliás, até chorava no capítulo final, dizia que era tudo tão emocionante.
E assim ela ia levando a vida, com um sonho aqui outro acolá como quem joga na mega sena e fica super rico até conferir o prêmio e ver que o bilhete não foi premiado.
Outra coisa que Jurema amava fora todas essas frivolidades era o forró do domingo no boteco do João Pedreira. A danada se soltava e era sempre disputada para as danças. Saía de lá pingando suor e feliz até não poder mais. Num desses forrós e entre uma dança e outra conheceu Zé Pipoco.
Achou engraçado demais o nome e perguntou o porquê do apelido. Ele respondeu sem muita expressão que era o pipoqueiro da praçinha da paróquia de Santa Helena e que, de tanto estourar pipoca, os amigos mais gaiatos começaram a chamá-lo assim. No começo ele disse que resistiu, ficou bravo, mas depois vendo que não tinha solução, desistiu e agregou o apelido ao nome, assim tirar sarro já não tinha graça e largaram do pé dele.
Ele tinha boa lábia e, entre um baião de dois e um xote, já estava dependurado nos beiços de Jurema e não largou mais. No terceiro forró que foram ele já dormiu no barraco dela e de lá saiu só depois de uma semana. Ela toda apaixonada dizia à dona Sophia que era amor de novela, que ele era seu Lázaro Ramos do morro, uma coisa de louco. Dona Sophia meneava a cabeça e dizia pra ela tomar cuidado, afinal, bicho homem era custoso em qualquer nível social. Tudo em vão, ela dizia que não dava pra esquecer a “pegada” daquele homem e vivia suspirando.
Com menos de dois meses Zé já estava morando no barraco de Jurema. Sempre galanteador, trazia florzinhas roubadas, um docinho aqui, uma surpresinha acolá e assim foi tomando espaço, trazendo seus pertences. O que ela estranhava era só uns equipamentos eletrônicos, uns sacos de farinhas diferentes, umas ervas para chá, que ele dizia que ela não podia mexer, pois ele comercializava tudo para ganhar uns trocados há mais. Ela respeitava, lógico!
O barraco era sempre movimentado, cheio de amigos que iam e vinham. Nunca viu alguém ser tão popular assim e o quanto ela era respeitada por eles, chegavam a baixar a cabeça quando ela passava. Meses se passaram, Zé pipoco só aumentando os negócios e Jurema feliz, feliz, mas daí é como diz o ditado: “Alegria de pobre dura pouco”.
Um dia, sem mais nem menos, baixou polícia de tudo quanto era lado no barraco da Jurema e nessa o Zé escapou fino que nem linha em buraco de agulha.
Descobriu que aquelas ervas eram maconha, a farinha, cocaína, os eletrônicos, carga roubada e Zé Pipoco, um dos maiores traficantes que a história já viu.
No começo, Jurema engaiolada, só chorava e dizia que não sabia o que era aquilo tudo, que também foi enganada e só pensava em voltar pra sua vida normal, mas a polícia ainda fazia pressão pra descobrir o paradeiro do seu companheiro.
Até que uma visita de uma amiga distante fez tudo mudar na cabeça de Jurema. Ela levou um monte de recortes de revistas, dos principais jornais e contou a Jurema que ela estava mais famosa que artista de televisão, que toda hora aparecia nos noticiários.
Quando ela foi embora, Jurema ficou conversando com seus botões e pesou sua vida antes de Zé Pipoco e agora. Estava na cadeia, isso não tinha dúvida, mas acreditava que aquela era a sua chance, estava famosa, nas capas de revistas. Tudo bem que não era como tinha sonhado, mas ela podia reverter tudo á seu favor.
Durante a noite, colocou seus miolos pra funcionar, criou todo um personagem e de manhã já era outra. Chamou a polícia e mandou avisar que agora ela ia falar.
Lembrou- se de filmes de ação, armou tudo na sua cabeça e mandou ficha, deixando os guardinhas boquiabertos. Saiu da sala de interrogatório como a mandante de tudo, a dona da boca, a chefona do tráfico e por incrível que pareça, ganhou respeito. As pessoas a olhavam com medo e a rádio peão só fazia as estórias aumentarem.
Ganhou regalias na cadeia, começou a comandar as outras presas. Aquela Jurema empregada doméstica, já não existia mais e de um jeito ou de outro ela conseguiu a fama e um personagem que ela mesma criara, melhor que qualquer folhetim de novela.

Luciana Barbosa

Trabalho!!

quarta-feira, 29 de abril de 2009

A Arte de oscular.



Que tal você me dar um ósculo? Não, estou de lentes de contato e não são seus óculos que quero. São ósculos, muitos e de amizades, porque sou uma moça casada. De outra forma não ia pegar bem.
Tudo bem você não está entendendo nada. Vamos recorrer a uma pesquisa rápida no dicionário, na verdade estou na página do Google, combinamos na crônica passada que não iríamos mentir. Aqui está: “1.beijo; beijo de paz e amizade
2.(Zoologia) abertura principal do esponjocélio, na extremidade livre do corpo das esponjas “.
Então. O que quero não tem nada a ver com a segunda parte na área da Zoologia, nada contra, mas o que pedi foi simplesmente um beijo de amizade, de paz, um ósculo.
Por que vivemos num mundo que a falta de tempo impera, queremos desenvolver vários projetos ao mesmo tempo e deixamos de tomar conta de coisas importantes: a nossa vida e nossas relações afetivas.
Estamos deixando de lado, na correria do dia a dia e na desculpa da modernidade, o que é de mais importante em nossa vida, porque dinheiro, caríssimos, e tudo o que ele pode comprar, não sustenta a alma, não preenche o vazio que sentimos independente da nossa posição social. Somos bons no discurso de que nos bastamos, podemos viver sozinhos e sermos felizes. Balela! O melhor da vida é termos carinho, aconchego e amizades que nos garantam o mínimo de conforto nos tropeços da vida.
Diante desse mundo de possibilidades, esquecemos até da ética de convivência e achamos tudo normal, achamos que o nosso sentimento e nosso bem-estar é o que basta.
E sinceramente não é. Por que faço para o outro o que não gostariam que me fizessem? Por que não me coloco no lugar?
E assim, com pensamentos cada vez mais egoístas, vou achando que o mundo vai bem e me recolho na própria solidão.
Sei que no meu caixão não cabe nada que tenho hoje de material. Então por que não cultivar os sentimentos como a calma, o discernimento, o desvelo para com o outro? Arrumar tempo na nossa correria para verdadeiramente sermos amigos.
Abraçar, oscular muito e amar o próximo, mas de uma forma madura, por que também conheço muita gente de trinta e tantos anos que ainda age como verdadeiro egocêntrico, achando que o mundo gira em torno do umbigo.
Viver em conjunto é muito melhor quando aprendemos fazer algo para alguém. Mesmo que para nós seja um gesto pequeno, é maravilhoso, faz diferença no nosso dia a dia e melhora até nossa aparência.
Então não perca mais tempo, abrace mais, conviva mais, oscule mais.
Pode ser que no princípio você estranhe um pouco, mas depois garanto, você nunca mais será o mesmo.
Então, um ósculo cheio de paz e amizade pra você e até nossa próxima crônica.

Luciana Barbosa.

segunda-feira, 30 de março de 2009

In Memorian.



Lamentamos dar a notícia de que a cronista Luciana Barbosa não escreverá mais esta coluna. Ela veio a falecer de estresse agudo por causa da crise que disseram a ela ser só uma marolinha, algo que não atingiria o nosso querido Brasil.
Calma, calma, não chore ou comemore. Primeiro de abril! Sim, uma pequena mentira pra ilustrar sobre o que quero escrever aqui. A mentira.
Tem pessoas que dizem que nunca mentiram, assim, ouço e tento fazer cara de paisagem. Quem nunca contou nem que seja uma pequena mentira que atire a primeira pedra. Vou dar um exemplo: Você está no trânsito e sabe que demora no mínimo vinte minutos pra chegar ao seu destino, toca o telefone, você atende e aquela pessoa que está te esperando há uns trinta minutos te pergunta:
_ Ta chegando?
E você nem titubeia, responde que em uns cinco minutinhos estará lá. Mentira. E não me venha com o argumento de que é uma mentira branda que não afetará em nada o andamento do universo. A questão não é essa.
Existem pessoas que vivem mentindo e nem sentem. Criam um universo paralelo e o pior, querem que acreditemos nele. Começam contando pequenas vantagens sobre relacionamentos, trabalho e quando nos damos conta, o sujeito está nos contando sobre sua viagem internacional que nunca aconteceu. A pessoa se perde em tantas mentiras para autoafirmação por complexo de inferioridade, que caem constantemente em contradição, virando alvo de chacota quando não estão por perto.
Fico pensando nessa cultura do primeiro de abril, de pregarmos peças nos outros, só para termos o gosto de poder enganar o próximo com o consentimento da comemoração.
O problema é que têm pessoas que vivem um eterno primeiro de abril.
Casamentos de mentira, amizades de mentira, trabalhos de mentira e fazem de suas vidas uma fábula em que nada é consistente e que, ética se torna palavra desconhecida. Porque a verdade é aliada da ética, tenha certeza disso.
Eu sei que mentir parece sempre ser mais fácil, mas quando fazemos disso um hábito passamos a mentir para nós mesmos, nos enganamos e isso nunca é bom, porque podemos enganar milhares, mas quando colocamos nossa cabeça no travesseiro, sozinhos com nossos pensamentos sabemos o que realmente acontece.
E se você não se incomoda com isso, acha normal, reveja seus atos e procure ajuda profissional porque acredito muito numa frase que minha avó já dizia:
_ Mentira tem perna curta.
E além das pernas curtas, ela tem o dom de afastar as pessoas que realmente nos amam e as melhores oportunidades. Pensem nisso. Ser verdadeiro vai ser sempre o melhor caminho.

Luciana Barbosa.

terça-feira, 24 de março de 2009

Difícil....



É muito difícil esquecer...
Teu corpo,
Teu beijo,
Teu jeito.
Dificil mesmo é lembrar,
corpos colados e quanta solidão...

Luciana Barbosa.

segunda-feira, 23 de março de 2009

O filme da vida de cada um.



Sentou na calçada e recostou-se no poste, respirou bem fundo sentindo o cheiro de chuva que estava por vir. Amava cheiros, o de chuva, temperos e frutas eram seus preferidos e sempre que os sentia era como se uma felicidade repentina tomasse conta da alma e do corpo. Isso era uma característica impressionante da sua personalidade, coisas simples o tocavam muito mais.
Havia dias que ele se sentia num cinema e tudo que o acontecia parecia surreal. Era como se fosse o espectador de um filme que estivesse acontecendo em terceira dimensão e ele só assistindo tudo, sem ter como modificar ou acrescentar nada.
Ficou parado ouvindo sua respiração e observando o movimento. Uma criança limpando o nariz, a mãe dependurada num telefone público esbravejando com o possível pai sobre um dinheiro que nunca vinha, do outro lado da rua no fio de alta tensão um pombo se equilibrava com uma pequena palha no bico resolvendo onde seria construído seu novo ninho.
Fechou os olhos um instante e ficou sentindo o vento no rosto, respirou fundo novamente e pensou na loucura que era viver. Só de pensar no funcionamento do corpo achava tudo um imenso milagre, quantos músculos, nervos, órgãos, tudo interligado de uma maneira frágil e ao mesmo tempo tão forte. Sempre achou que cada minuto deveria ser tão melhor aproveitado.
Abriu os olhos bem devagar e olhou ao seu redor, o filme já havia mudado o roteiro. A mãe já arrastava o filho ladeira abaixo, o pombo já havia voado rumo ao seu destino. Tudo em questão de minutos. A vida era assim, tudo tão rápido.
Levantou-se bem devagar, balançou o pó da calça e deu uma espreguiçada daquela que estalam os ossos, esboçou um sorriso tranquilo de quem chegou no ponto certo da serenidade.
Tudo o que queria e precisava era de paz para aproveitar os dias que tinha pela frente, sabia que nem todos seriam assim, mas tinha um bom discernimento e força de vontade para entender o filme da vida de cada um.
Estava bem menos materialista, mais humanitário e desapegado da vaidade desmedida, concluiu que estava era muito bem.
Levantou o braço e pegou uma folha de uma árvore de canela que saltava pelo muro, amassou bem devagar e aspirou o aroma, aquilo lembrou sua infância com os chás de sua mãe e o pão com manteiga no fim de tarde.
Resolveu que por hoje seu filme terminaria assim, de frente a uma imensa xícara de chá de canela e um pão fumegante com manteiga derretida, não precisava de mais nada pra ser feliz. Pelo menos por hoje.


Luciana Barbosa.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Desilusão de Carnaval.



Ulton, e é bom que se diga, que na realidade o pai queria que se chamasse Wellington, mas por obra de um escrivão semianalfabeto, o nome grafou se assim e como explicar sempre complica mais e demora, ficou Ulton mesmo.
Mas isso não tem a menor importância, porque ele poderia ser chamado de qualquer nome que o fato em questão iria ocorrer.
Carnaval, turma reunida e destino traçado. Iriam para o interior de São Paulo, para casa de amigos e Ulton planejava pegar todas as moçoilas desavisadas e beber quantas cervejas seu fígado aguentasse.
Ele estava naquela fase de solteiro pegador em que os amigos mais próximos se casam e ele se sente o dono do harém. Perto dele, se bobeasse era gol.
Primeira noite, reconhecimento de área, conversa aqui, sorriso dali, charme pra outra e a folia ia de vento em popa, ele se sentindo o galo do terreiro, o galã de novela mexicana, o último biscoito do pacote.
No outro dia aquela ressaca e a promessa de beber menos ou comprar uns engoves há mais para agüentar o batidão. Pensou muito pouco porque a cabeça doía e ficou, lógico, com a segunda opção, iria à farmácia naquele momento mesmo.
Chegou lá naquela posição de quem parece estar psicografando uma mensagem do além, óculos escuros, cabeça baixa e uma mão sempre segurando a testa pra agüentar o peso. Pensou que ainda descobriria a fórmula para eliminar a ressaca, porque parar de beber, estava fora de questão.
Pegou os engoves e foi pra fila andando bem devagar, pensando que rebater seria a solução. Iria melhorar assim que abrisse a próxima latinha gelada, tinha certeza. De repente fixou o olhar um pouco acima do chão e viu uma perna torneada, pelos descoloridos, com dificuldade foi erguendo o olhar, coxas, bunda, tudo na medida, a nuca descoberta, por um momento até se esqueceu da ressaca, mas quando pensou em agir ela saía porta afora e ele nem conseguiu ver o rosto da beldade.
Aquela cena se repetiu durante o carnaval algumas vezes. Na fila da cerveja, no restaurante e ele nunca conseguia ver o rosto, virou uma obsessão e ele só pensava na tal loirinha, até que se viu na fila do supermercado e a danadinha na frente. Pensou. É hoje!
Foi chegando mais perto, sentindo o perfume e quando ia tocar seu ombro pra conversar, ouviu um:
- Tianaaaaaaaaa, eu te conheço Tianaaaaaa.
Olhou pra trás e viu dois travecos, daqueles imensos, na maior galhofa. E não paravam de gritar a tal da Tiana. Ele olhou pra ver se identificava a danada ali na fila e notou que o objeto do seu desejo, ria bem disfarçado, o que era normal, ele mesmo estava achando a maior graça.
Mas elas não paravam de gritar e quando ele percebeu a fila havia andado e a loirinha ia pedir os pães pra ir embora, ele não podia perder mais essa oportunidade. Só que quando chegou bem perto para chamar a atenção da moça, ela abriu a boca e fez o pedido.
Ele percebeu uma voz fanhosa, forte para uma moça tão delicada, e mesmo depois de tantos dias de álcool na cabeça, conseguiu raciocinar.
Chegou mais perto e chamou:
_ Tianaaaa.
O traveco se virou, olhou pra ele e soltou todo aquele gogó masculino que Deus lhe deu.
_ Até você bofe?? Eu te conheço??? Se situa.
E saiu arrastando os tamancos que nem tão pequenos era.
Ulton olhou para um lado, para outro e desandou a rir. Carnaval não era fácil não, mas, não seria essa pequena desilusão que o faria desistir da luta.
Agora paquerar só se visse a moça de frente e tivesse certeza da garantia do produto, isso ele tinha certeza!

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

A vida é tão rara.



Para quem conhece a música do Lenine, Paciência, o título com certeza vai parecer familiar. Sim, pra você que está lendo essa crônica e não conhece transcrevo um pedaço que julgo muito importante para o que vou escrever:
“Será que é tempo que lhe falta prá perceber?
Será que temos esse tempo pra perder?
E quem quer saber?
A vida é tão rara, tão rara...”
Passei por algo extremamente inusitado nesta última semana. Meu companheiro, com quem me casei há apenas dois meses, foi para uma mesa de cirurgia fazer uma operação cardiaca com direito a peito aberto e UTI, e com toda a tecnologia existente vi, mesmo que pequena, a possibilidade de perdê-lo, de estar novamente só, de não ter quem me suporte nos meus piores dias e de não ter quem ria das minhas bobagens e me faça sentir sempre um ser humano melhor.
Não se preocupe, ele está bem! Costurado, fazendo uma inusitada dança do operado e extremamente animado para a vida, e é aí que entra a letra da música.
A Vida é tão rara, e será que percebemos que não sabemos quanto tempo temos disponível? Precisamos de que algo nos chacoalhe, nos estremeça, nos apavore para pensarmos em nós e no que realmente queremos.
Guardamos mágoas antigas, problemas que seriam tão facilmente resolvidos, não nos permitimos perdoar simplesmente a nós, quanto mais aos outros.
Gastamos muito da nossa energia vital correndo a vida inteira atrás da perfeição, sendo que ela não existe, nem em nós.
Não há relacionamentos perfeitos, amigos perfeitos, vida perfeita. Até por que tudo seria uma chatice, uma rotina sem fim. Como reconheceríamos o bom se não tivéssemos experimentado o ruim?
Esse é o melhor momento para se viver. Estamos respirando e apesar de todos os problemas existentes ainda temos as melhores oportunidades para tentar algo diferente e inusitado. Sermos simplesmente felizes sem muita complicação, sem muito tropeço, porque felicidade é estado de espírito, e não dá pra ser feliz o tempo todo.
Aproveite os momentos, crie situações favoráveis e seja menos amargo.
Porque se olharmos em volta notaremos que a vida é mesmo tão rara e que somos privilegiados por apenas existirmos.


Luciana Barbosa.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Sob a ótica das possibilidades!



Na maior parte do tempo sabemos o que deve ser feito para vivermos melhor, mas precisamos de algo ou alguém que desperte em nós, nem que seja por pouco tempo, a necessidade de melhora, da busca por dias perfeitos.
Passamos muito tempo correndo atrás de dinheiro, de bens materiais, sendo que o que realmente nos alimenta, nenhum dinheiro pode comprar e se chama paz de espírito.
Porque sem ela, nada se completa, nada satisfaz. Posso mentir para o mundo, posso agregar pessoas, posso ter dinheiro, mas não posso me enganar o tempo todo. Em algum momento reconheço em mim o ser humano que habita, um corpo que se desgasta, e no fim, não valerá nada.
Minhas ações, pensamentos, esses sim, perduram e é o que me faz sentir mais feliz ou extremamente infeliz, pois não posso me enganar, posso enganar a todos, mas não a mim.
Então, que tal tentarmos a partir de hoje olharmos nossas vidas sob a ótica das possibilidades?
A possibilidade de sermos mais felizes com o que temos, sermos mais verdadeiros conosco e sermos mais amáveis com o mundo. Sim, porque fazemos parte dele e somos responsáveis por tudo que gira ao nosso redor.
Que tal acreditarmos mais em nosso poder de conquista e que somos dotados de talentos únicos, nem que seja nas mínimas coisas como contar uma piada que faça o outro rir ou apenas saber o momento de calar e ouvir?
Você está vivo, esta já é por si a máxima das possibilidades. Então, por que não sonhar com aquela viagem distante, aquele amor que ainda não chegou ou aquele emprego novo?
Junto com as possibilidades há sempre o poder da realização, porque pensamento é ação e é o primeiro passo para o nascimento de um novo empreendimento, para mudanças pequenas ou radicais, para reconciliações que parecem impossíveis.
Pra vivermos sob a ótica das possibilidades, só é preciso uma coisa: Acordar de manhã e reconhecer que respirar é uma dádiva e agradecer. É ser mais prestativo, menos amargo, mais confiante.
É saber e entender de uma vez por todas que viver é a melhor das possibilidades e que é melhor aproveitar todos os momentos.

Luciana Barbosa.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Carpe Diem.




Sentiu aquele arrepio de que algo ruim iria acontecer. Dificilmente errava. Seus pressentimentos eram sempre certeiros e nunca notícias boas.
Olhou pela janela do quarto e a chuva descia fininha como se fossem lágrimas. Detestava meio termo, desde criança nunca gostou, ou era, ou não era. Ou a chuva vinha torrencial pra molhar tudo e todos, ou nem deveria dar o ar da graça. Respirou um pouco mais fundo. “Que dia triste” e nem sabia por quê. Aquele aperto no peito foi tomando uma forma claustrofóbica. Parecia que queria sair, explodir suas entranhas. Chorou, depois fez uma prece, e logo em seguida, se sentiu tola.
Odiava dias cinzentos, pois se sentia fadada ao infortúnio e à desgraça. Respirou fundo e ficou ali naquele monólogo tão pessoal e vazio que não iria dar em nada, isso ela já sabia.
Foi até o guarda-roupa e pegou o melhor casaco que tinha, pelo menos bem agasalhada iria estar para enfrentar o trajeto até o trabalho. Pegou sua sombrinha e abriu a porta bem devagar como se todo o mal do mundo estivesse à sua espreita. Ficou um tempo com a porta entreaberta respirando aquele ar gelado e sentindo o vento no rosto.
Como não tinha jeito, saiu e trancou a porta rapidamente e já na descida da escada pisou numa poça, meneou a cabeça num sinal de que realmente aquele não seria seu dia.
Tinha a sensação ao caminhar, que observava tudo de uma forma inusitada, como se estivesse fora do corpo, como se a mente não necessitasse dele para continuar o caminho. Parou na padaria de sempre para tomar o primeiro cafezinho da manhã. Desatenta, deixou metade cair no casaco e mentalmente soltou um palavrão. Definitivamente achou que melhor seria se tivesse ficado em casa, dormindo.
Pelo menos a chuva podia dar uma trégua, já iria ajudar, e muito, a melhorar o seu estado de espírito.
Estava a apenas a dois quarteirões da gráfica onde trabalhava, deu uma paradinha e olhou para a placa já desbotada pelo tempo. Pensou seriamente em dar meia volta e ir para sua cama quentinha, mas ela sempre fora responsável e detestava mentiras, aliás, não sabia nunca como dizê-las, e por isso, sempre se dava mal.
Sentiu novamente aquele arrepio na espinha e fechou os olhos momentaneamente. Repetiu a prece e abriu os olhos bem devagar, respirando bem compassado, aquilo só podia ser coisa da sua cabeça, resolveu não pensar mais nisso e culpou o tempo pelo arrepio, estava frio.
Começou a atravessar a rua e deu um leve sorriso. Tinha dias que nem ela se suportava, parecia louca e nem podia culpar sua TPM, pois àquele mês já estava livre dessa bomba hormonal.
Pisou na calçada bem devagar, escolhendo um lugar mais seco para pisar. Foi aí que ouviu um barulho e gritos. Tudo pareceu tão irreal, tão rápido.
Um carro, vinha em sua direção de uma forma desgovernada, já tendo atingido a barraquinha de flores de dona Edith e mesmo assim continuava a toda velocidade. Ela ficou sem reação e nem saberia dizer quanto tempo durou, e nem poderia.
Testemunhas atordoadas tentavam ordenar os fatos e remontar a cena depois do acidente, mas a maioria se lembrava de uma coisa. Aquela moça antes de ser esmagada pelo veículo e cair morta ali mesmo, ainda gritou:
-Meu Deus! Então é assim que termina?
Se ela soubesse, com certeza teria aproveitado melhor suas últimas horas, porque à morte, essa sim era inevitável.

Luciana Barbosa.