sexta-feira, 24 de julho de 2009

Cidadão do mundo.



Simão desde criança, sempre fora calado. Gostava de ficar por horas a fio, sentado num galho de uma goiabeira no fundo do quintal. Quando a mãe lhe perguntava o que fazia tanto por lá, mudo e sozinho por tanto tempo, ele respondia com o olhar distante que ficava apenas ouvindo o silêncio. Ela meneava a cabeça, achando seu filho um completo estranho.
Quando cresceu Simão continuou assim, tendo um mundo particular de poucas palavras, poucos amigos e sem nenhuma aventura aparente. Ele era para todos que o cercavam uma incógnita.
O que mais chamava atenção, era que, mesmo depois de formado em computação, ganhando seu dinheiro e tendo liberdade para fazer o que bem entendesse, continuava morando com sua família e passando preciosas horas no mesmo fundo de quintal e no mesmo galho daquela goiabeira tão envelhecida pelo tempo.
Outra mania de Simão era escrever e não pensem que ele usava o seu computador super moderno. Usava uma máquina de escrever, uma Olivetti que seu pai tinha deixado num canto da biblioteca mais como um enfeite, um objeto obsoleto e sem nenhuma utilidade.
O mais impressionante era que ninguém sabia o que possuía aquelas páginas. Ele nunca permitiu nem que sua mãe pudesse ler ou saber o que os escritos diziam.
Outra particularidade interessante de Simão era ele nunca ter saído de sua cidade natal. Desde criança, quando falavam que iam viajar, ele abria o berreiro. Gritava tanto que faltava enlouquecer seus pais. A avó sempre remediava dizendo que deixasse o neto para que lhe fizesse companhia.
Ele no auge de seus trinta e dois anos nunca havia ido á lugar algum, seu mundo e lugar preferido era aquele fundo de quintal.
Até que um dia, sem uma explicação aparente Simão não acordou mais. Foi embora dessa vida sem alarde e da maneira que ele mais sabia, calado.
A mãe, depois de ouvir as explicações médicas, de enterrar o filho, se trancou no quarto de Simão. Sentada numa cadeira foi passando os olhos devagar pelo ambiente tentando aliviar a dor que sentia. Até que parou os olhos numa caixa em cima do guarda roupa.
Com a ajuda do marido a retirou de lá e quando abriu, ela estava cheia de escritos de Simão. Camalhaços e camalhaços de folhas escritas na velha Olivetti.
A mãe abraçou as folhas carinhosamente e durante dias se dedicou a lê-las.
Ali, naquelas páginas Simão descrevia com uma clareza incrível, lugares que nunca esteve, romances que nunca viveu, comidas que nunca provou. Foi aí que sua mãe entendeu tudo.
Ele nunca quis sair de sua cidade, pois não precisava, ele já possuía o mundo todo dentro dele.


Luciana Barbosa.