segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
As mulheres de Botticelli.
Fico impressionada com o que nós mulheres nos submetemos para nos tornarmos magras e atraentes. Dietas milagrosas e sem fins que nos privam das melhores maravilhas gastronômicas da humanidade, como um inocente sorvete no fim da tarde com amigos, cintas que não nos deixam respirar e todo tipo de exercício físico possível e imaginável. Tudo bem! Exercício nem sempre, mas queremos e esperamos pelo milagre do emagrecimento.
Lendo uma destas revistas semanais cheias de cultura inútil, mas que adoramos pra saber quem se separou, quem se casou, com qual roupa a fulana foi à esquina, quem o galã garanhão comeu na semana passada, encontrei a bela da vez. Uma dessas modelos super faturadas e de pele perfeita pregando que o bonito é ser magra e que ela esta trabalhando para ficar ainda mais magra do que o seu normal.
Gente! A mulher é só pele e osso, perfeitos, diga se de passagem, e quer emagrecer mais, porque assim ela ganha muito mais trabalhos. E afirma que não adianta reclamar, o bonito e chique é ser magro.
Aí vou ao espelho e me analiso. Tenho certeza de que aos vinte, essa barriguinha levemente arredondada não existia, esse papinho debaixo do meu queixo querendo aparecer, nem em sonho era concebido e esses braços fortes que mais lembram uma caminhoneira, eram finos e delgados.
Tudo bem. Estou exagerando um pouco como toda mulher. Para nós, qualquer espelho engorda e míseros cem gramas a mais, são o fim. Volto ao espelho agora com mais amor por mim. Espera lá!
Tento ser o mais saudável possível, não vivo descontrolada com sacos de batatas industrializadas e refrigerantes enormes na volta do dia, tenho pernas, bunda e ultimamente, depois que deixei de ser muito magra, até peitos melhores ganhei. Então por que vivo sempre querendo o padrão modelo-atriz-apresentadora?
Eu sou normal, não ganho rios de dinheiro vendendo minha imagem e não preciso ser escrava de nenhum padrão para ser bonita. Porque ser bonito está na atitude, uma mulher que se cuida, anda cheirosa, arrumadinha tem seu valor independente do peso e, por favor, sejamos bem humoradas, isso sim garante um excelente relacionamento.
Adoro, pra falar a verdade, o padrão de Botticelli, pintor italiano renascentista, que em seus quadros retratava mulheres cheias de curvas, humanas e possíveis.
É isso! Somos humanas e lindamente possíveis então pra que procurarmos um padrão que não é o nosso? Eu, quando dou estas loucas de que tenho que ser a miss magreza do pedaço, tomo um banho, coloco um vestidinho que me favoreça e passo de frente a uma obra de construção. Nada que um sonoro: “gostosa” não resolva!
Luciana Barbosa.
segunda-feira, 8 de dezembro de 2008
O Cabelo.
Itamar era um ser extremamente divertido e amoroso. Bem ligado à família, só tinha uma coisa que incomodava: Era metódico. Seu apartamento era limpo e arrumado, sua mesa no trabalho, mesmo nos piores dias, era organizada e clean, sempre mantinha tudo na mais perfeita ordem até com sua vida sentimental. Não se importava se estava sozinho ou acompanhado, ou se iria envelhecer sozinho. Ele gostava da sua vida seguindo o curso normal e sem grandes surpresas.
Tinha um topete que era sua marca registrada e gastava rios de dinheiro pra manter o cabelo sempre bonito e arrumado, era sua obsessão.
Um dia, depois de um dia exaustivo de trabalho, ele entrou em seu carro e saiu distraído quando viu um cabelo longo e loiro preso no limpador do pára-brisa. Ficou prestando atenção nos movimentos que ele fazia, era como uma dança ritmada e cheia de sedução, o sol batia no fio fazendo ele brilhar e parecer ainda mais bonito aos olhos de um encantado Itamar.
A primeira reação de qualquer ser desprovido de poesia seria retirar o fio e jogá-lo fora, mas não ele. Sabia ver as belezas ocultas da vida e amou tanto aquele fio dançando na sua frente que passou a cuidar para que ele se mantivesse ali, firme pelos caminhos que ele fazia no dia-a-dia.
Aliás, ele até mudou o trajeto que fazia sempre, para escolher ruas mais sinuosas que proporcionassem movimentos bem mais interessantes para aquele fio de cabelo.
Divertia se imensamente quando estava dirigindo e olhando aquele balé cheio de nuances até que começou a perceber, depois de duas semanas, que o fio começara a desprender-se. Sentiu o coração pesar. Como poderia viver sem aquela distração diária, sem o brilho daquele fio? Passou a andar mais devagar e ser extremamente cuidadoso para que o fio não se desprendesse tão rápido, mas era inevitável. O fio mais dia menos dia iria voar e ele não achava prudente prendê-lo porque aí sua dança perderia a naturalidade e beleza.
E como pressentido num dia de ventos mais fortes, o danado alçou vôo. Fez uma pirueta, deu uma enroscada no ar e sumiu. Parou o carro e ficou ali, olhando para o nada, com aquela sensação estranha de um vazio sem explicação.
Depois do ocorrido, Itamar voltou para sua vida metódica e previsível novamente. O único resquício que sobrou daquele fio bailarino são os suspiros que vez ou outra se escuta quando lhe ocorre as lembranças do inusitado balé.
Luciana Barbosa.
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